Conselho inicia processo de tombamento do dialeto "caipiracicabano"

14/05/2016 13:11

Foi aprovada nesta sexta-feira (13), em reunião realizada na sede da Semac (Secretaria Municipal da Ação Cultural), no Engenho Central, a solicitação junto ao Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Piracicaba (Codepac) do registro do dialeto e sotaque “caipiracicabanos” como patrimônio imaterial. A proposta, apresentada por pelo Instituto Histórico e Geográfico de Piracicaba (IHGP), Academia Piracicabana de Letras (APL), Instituto Cecílio Elias Neto (Icen) e a Associação Piracicabana de Artistas Plásticos (Apap) tem o objetivo de oficializar o linguajar caipira local como identidade cultural da cidade.

Na reunião foi apresentado um relatório prévio sobre o assunto, elaborado por uma equipe formada por quatro conselheiros da entidade: o historiador Fábio Bragança, da Câmara de Vereadores de Piracicaba, a publicitária Fátima Silva, da Semac, a historiadora Renata Gava, do IHGP, e o arquiteto Marcelo Cachioni, presidente do Instituto de Pesquisa e Planejamento de Piracicaba (Ipplap).

"Essa iniciativa valoriza a cultura, a história e memória da cidade de Piracicaba e dos piracicabanos e também das cidades da região", ressalta o prefeito Gabriel Ferrato.

Com a aprovação do parecer, segundo Renata, começam os levantamentos de informações que darão sustentação ao processo, com consultas a especialistas, levantamento de documentos históricos e registros de manifestações diversas, em gravação de voz, imagens e escritas, confirmando a relação direta entre a formação da cidade e o que ficou consagrado como cultura caipiracicabana.

"Essa peculiaridade que caracteriza o dialeto caipira, que ressoa em letras de modas, no ponteio da viola, carregando em suas pronúncias os 'erres' e trocando o 'L' pelo 'R' e 'LH' pelo 'I', é o que define o linguajar caipira como a língua dos Bandeirantes", explica Renata.

No entender da historiadora, a supressão de letras na palavra ou expressão é um traço forte desse falar caipira, juntamente com um estiramento mais ou menos excessivo das vogais, dando ao homem caipira a referência de introvertido e apressado. "O dialeto caipira originou variantes e as manteve. Esta linguagem contém muitas formas arcaicas e característica coloquial, como o elemento principal deste falar, o R retroflexo, mas há também um padrão linguístico característico como a troca do 'L' pelo 'R', assim como casos de 'R' e 'S' caírem quando final de palavra, o 'D' das formas verbais em ‘ando’, ‘endo’, ‘indo’ cai e vocaliza-se em 'I'", detalha.

De acordo com o jornalista Cecílio Elias Neto, estudioso da cultura piracicabana e conhecido pela sua luta em defesa do linguajar caipira, "o termo caipiracicabano é uma criação do professor Thales Castanho de Andrade. O professor João Chiarini foi o grande responsável por propagá-lo. A minha missão sempre foi mantê-lo vivo. Porque a cultura caipiracicabana é a nossa identidade", reforça.

Segundo Elias Neto, "o sotaque caipiracicabano nasceu em São Paulo, a partir da relação dos índios com os portugueses, e chegou até nós pelos rios, fixando-se no Vale do Médio Tietê, onde está Piracicaba. "É uma questão regional que deveria ser defendida regionalmente, por todas as cidades que se consideram caipiras", defende.

Cecílio explica que o caipiracicabano é uma língua em que a pronúncia do 'R' se dá com a língua voltada para dentro, enquanto o carioca fala o 'R' com a língua voltada para fora. "Por isso, onde um caipira fala, é logo notado. A língua é a sua identidade. Muitas vezes ele se vê em uma posição inferior, como se estivesse cometendo um erro. Isso é absurdo", enfatiza.

O jornalista lembra que o presidente Prudente de Moraes ficou conhecido como Biriba, o presidente caipira. "Com essa força de projeção nacional, deveríamos explorar melhor esse diferencial como uma marca. A cidade tem sido procurada pelos grandes canais de televisão exatamente pelo seu sotaque. E os repórteres falam de Piracicaba com entusiasmo, porque de fato toca em uma raiz cultural. Uma raiz cultural, por sinal, que deveria ser melhor explorada economicamente, para fortalecer nossa economia", concluiu.

O procurador-geral do município e presidente do Codepac, Mauro Rontani, explica que a iniciativa tem um valor imenso. "Precisamos agora aprofundar os estudos para estruturarmos a solicitação adequadamente, a fim de que o sotaque e o dialeto caipiracicabanos, como bem imaterial, possam fazer parte do nosso livro de tombo de registro imaterial e receber o título de Patrimônio Cultural de Piracicaba. O que antes era pejorativo deve ser considerado motivo de orgulho para a cidade", conclui.

 

Reportagem: Da Redação

Foto: Divulgação/Alinne Schmidt/Prefeitura de Piracicaba